Sobre a distinção Hubert Godardiana entre movimento e gesto. O movimento percebido “como um fenômeno que descreve os deslocamentos estritos dos diferentes segmentos do corpo no espaço, do mesmo modo que uma máquina produz movimento. Já o gesto se inscreve na distância entre esse movimento e a tela de fundo tônico-gravitacional do sujeito, isto é, o pré-movimento em todas as suas dimensões afetivas e projetivas. Chamaremos de pré-movimento essa atitude em relação ao peso, à gravidade, que existe antes mesmo de se iniciar o movimento, pelo simples fato de estarmos de pé. A relação ao peso, à gravidade, já contem um humor, um projeto sobre o mundo. É exatamente ai que reside a expressividade do gesto humano, expressividade que a máquina não possui”. (Hubert Godard, Gesto e Percepção, pg. 13)
Partindo destas definições, a rigor não existiria movimento humano que não fosse gesto, já que o movimento é sempre atualizado/afetado pelo ”humor” do momento. Mas talvez existam movimentos e danças “que se queiram” movimento, enfatizando o caráter biomecânico do corpo, e outros que se queiram gesto, que busquem dar maior visibilidade justamente ao que move o movimento.
Quando a gente fala que ta fazendo uma coisa mecânicamente, em geral quer dizer ‘sem atualizar a presença’, sem dar atenção para a experiência do que é feito. Legal pensar isso à luz da distinção godardiana de movimento x gesto. Faz pensar que esta forma de pensar o gesto está atrelada à noção de experiência.
Ronie me mandou um texto super interessante do Jorge Larrosa Bondía – Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Neste trecho abaixo, ele cita Heidegger (1987):
[...] fazer uma experiência com algo significa que algo nos acontece, nos alcança; que se apodera de nós, que nos tomba e nos transforma. Quando falamos em “fazer” uma experiência, isso não significa precisamente que nós a façamos acontecer, “fazer” significa aqui: sofrer, padecer, tomar o que nos alcança receptivamente, aceitar, à medida que nos submetemos a algo. Fazer uma experiência quer dizer, portanto, deixar-nos abordar em nós próprios pelo que nos interpela, entrando e submetendo-nos a isso. Podemos ser assim transformados por tais experiências, de um dia para o outro ou no transcurso do tempo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário